quinta-feira, 11 de março de 2010

TEXTO: PALAVRAS DO CORAÇÃO













Certo dia acordei com o peito vibrando. Vibrou, vibrou, vibrou até que dele começaram a brotar letras, palavras, frases inteiras que caiam sob a mesa e formavam poemas. Era estranho, mas era bom. Não doía, pelo contrario, dava uma sensação muito gostosa, algo assim expontâneo, leve, suave.

Durante muito tempo fiquei assim, com as palavras saltando e pulando, pulando do coração.

Muita gente estranhava, afastavam, olhavam aquele estranho brotar de dentro do meio peito que me acompanhava por onde estivesse. Mas eu nem ligava, estava feliz, não importava o que dissessem.

Um dia, as frases foram minguando, as palavras secando e as letras pararam de pular. Fiquei triste sem saber como reativar aquela sensação, mas nada pude fazer.

Tempos passaram e a sensação voltou, as letras romanas, itálicas, maiúsculas ou minúsculas, não importava, voltaram a brotar, criavam frases doces, linhas carinhosas, diziam de boa vontade, superação, abnegação, aquelas coisas que só podiam sair do coração. Brotou até uma frase que nunca havia proferido, caiu, formou, mostrou e ficou registrada.

Pouco tempo passou, uns poucos meses, porem muitos dias, menos de 60 talvez, recolhia as frases por onde caiam, guardava e contava orgulhoso, frases evidentes, correntes, transparentes, envolventes, saídas do fundo do coração. Mas estranhei, o fato estranho, inusitado, único talvez, não despertava interêsse. Virara banalidade? Tornara-se algo patético, pouco poético? E pouco a pouco as frases foram ficando incompreensíveis, as letras não mais se encaixavam, não agradavam e foram sendo substituidas por uma sensação de desapontamento, de solidão, de abandono e de arrependimento.

Num momento preciso, o peito parou de pulsar, um estrangulamento, um sufoco, uma falta de ar. Tremi, senti o sangue subir, a boca emudeceu, os olhos abriram e uma dor na cabeça forte, terrível, latente e para meu espanto, uma frase nítida pulou da cabeça e não do peito. Frase curta mas totalmente legível, caiu na mesa sob meus olhos e puder ler. Na mesa eu li, estava lá, claro, em maiúsculas, corpo 42, grande. PARA QUE?

Depois deste dia, as palavras não mais saíram de meu peito. Agora sei que não depende de mim. Eu não consigo tirar estas frases, elas tem que sair expontaneamente. Talvez alguém consiga chacoalhar novamente meu peito e as palavras brotem. Mas tem que chacoalhar com carinho, tratar com delicadeza, valorizar as palavras que dele brotam. Talvez seja exibido, quer atenção, quer que entendam as doces palavras que dele brotam. Não quer pedras, quer mel e nada de fel. Este peito nasceu para pulsar e não para apanhar. Pobre peito poético, patético, querem te tornar cético. Querem que se equipare ao sândalo, que perfume os machados que o ferem. Não se conformam que já emudeceram este peito, secaram as lindas palavras que dele jorravam. Ai de ti pobre peito poético, quieto e atacado. Mas de ti não sairão palavras de rancor, de desamor, de agressão ou de ataque. Para os que não te entendem, criticam sem razão, lançam culpas que a ti não cabem, responde com o silêncio. Afinal, as últimas palavras que vi lançar ao espaço foram PARA QUÊ?


Foto e Texto: Orley  

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